As casas, os amigos e os rebuçados

"Tens de vir lá a casa para te mostrarmos o sítio"

Esta é a pior frase que me podiam dizer. Podiam dizer que eu sou um cocó, que o mundo ia acabar ou que o Benfica ia descer de divisão. Tudo, menos isto!

Quando uma pessoa chega à idade em que estou actualmente, os amigos começam a casar-se, a comprar casa e a ter filhos. O casamento dá para aguentar porque dá para ficar bêbado e é à borla pois nem prenda oferece porque sou contra esses materialismos. A cena dos filhos também é fácil de ultrapassar porque é só dizer que o miúdo é giro - mesmo quando não é - e os pais ficam logo todos babados.

O problema é quando temos de ir ver a casa nova.

Ficamos sempre com a sensação que nos convidaram antes do tempo pois a casa nunca está sequer mobilada. Penso que o gozo até está naquele jogo de imaginação:

"Aqui vai ficar o sofá"
"Aqui fica a mesa"
"Aqui ..."

Porque é que não nos convidam quando já lá estiverem as coisas?

Outra coisa é que mesmo sem mobília e, especialmente, sem sítio para sentar ... há sempre uma televisão. Isso, sim, é importante. O que se faz é basicamente ficar sentado no chão a comer alguma coisa fria enquanto não instalam o gás e a ver televisão. É como se todos os princípios básicos de divertimento e de festa se dissipassem assim que passam a ter casa própria. Deixam de ir beber um copo e passam a ir beber um cafezinho, transformam-se me brancas de neves das 2h da manhã pois esse parece ser um limite no qual se transformarão em abóbora ou sapato ou lá o que é. E começam a usar palavras como "ajuntamento", "sarau" ou mesmo "à maneira". Este último não é bem uma palavra mas é uma expressão bem à maneira.

Passado um bocado levam-nos a ver o resto da casa, que nós tentamos evitar com um simpático "Deixa estar, estou tão maravilhado com a sala que não conseguiria ver o resto da casa". Nunca nos safamos. Temos de ver a casa de banho, o futuro quarto dos meninos, tudo! Até a despensa que está, obviamente, vazia.
Aqui, o truque para os satisfazer é usar só sons básicos como "hãhã", "yaya" ou "hmm". Não impedem, no entanto, a tour completa. Uma boa ideia era cobrarem para não termos de fazer a tour. "Queres vir ver a casa ou trouxeste o serviço de mesa que te pedimos?" Sempre era preferível.

Em suma, todo o problema se resume a excesso de entusiasmo. Estes casais jovens têm muito disso e é assim que nascem os bebés. E depois de nascerem os bebés eles começam a ficar com os corpos deformados, infelizes e finalmente divorciam-se. Depois compram uma casa e lá vamos nós ver a nova casa ...